Preços de frutas, verduras e legumes orgânicas dependem do canal de distribuição #40

Enviado por Seed4Life em qui, 28/10/2021 - 10:30
#40

Queda no consumo de FVL (frutas, verduras e legumes) e aumento das taxas de obesidade 


A Segurança Alimentar e Nutricional de diversos grupos populacionais continua sendo um desafio global. No Brasil, o conceito de Segurança Alimentar e Nutricional (SAN) está na Lei nº 11.346/2006, que estabelece a “realização do direito de todos ao acesso regular e permanente a alimentos de qualidade, em quantidade suficiente, sem comprometer o acesso a outras necessidades essenciais, tendo como base práticas alimentares promotoras de saúde que respeitem a diversidade cultural e que sejam ambiental, cultural, econômica e socialmente sustentáveis”.

O acesso a alimentos nutritivos é uma dimensão essencial da segurança alimentar. As frutas, legumes e verduras (FLVs) são as fontes naturais que têm maior abundância de micronutrientes, mas nos países em desenvolvimento o consumo diário de FLVs é apenas de 20% a 50% do recomendado pela Organização Mundial da Saúde (OMS). A situação no Brasil é semelhante à observada nesses países, assim como a consequência: aumento nas taxas de obesidade na população de renda mais baixa. Portanto, parte importante da segurança alimentar e nutricional pode ser alcançada ampliando o acesso a um bom sortimento de FLVs, a preços baixos.

As FLVs orgânicas reconhecidas por algum sistema de garantia da qualidade contêm mais micronutrientes do que as convencionais, como mostra a revisão dos estudos laboratoriais feita por Borguini e Torres.  Os orgânicos vêm de sistemas produtivos que não podem utilizar pesticidas e nem fertilizantes químicos. Ou seja, FLVs orgânicas não podem conter resíduos de pesticidas danosos à saúde humana, e são produzidos sem sobrecarregar os ecossistemas com nitrogênio e fósforo. 
Os consumidores desconhecem que significa a qualidade “orgânica” dos alimentos, sobretudo os tipos de garantia e certificação da qualidade orgânica. A regulamentação específica para proteger o consumidor do potencial oportunismo foi iniciada no Brasil nos anos 2000 e permitiu o selo para orgânicos. Essa regulamentação criou três formas de garantia da qualidade: a Certificação por auditoria; os Sistemas Participativos de Garantia; e os Organismos de Controle Social, para a Venda Direta ao consumidor.
Para os circuitos longos de comercialização, como supermercados, a legislação reconhece a certificação por auditoria e por Organismos Participativos de Avaliação da Conformidade (Opac). Os OPACs combinam objetividade e independência com uma dose grande de conformidade social, construída coletivamente entre produtores e outros atores. As “visitas de pares”, realizadas periodicamente pelos membros do grupo local normalmente de pequena escala, desempenham o papel de controle interno. O “olhar externo” é realizado por um conselho de ética formado por pessoas não ligadas ao empreendimento ou organização a ser certificada. O controle para a venda direta é feito por Organismos de Controle Social, associações formalizadas de produtores que se submetem a um processo de revisão de pares que lhes assegura a comercialização direta ao consumidor por um representante da organização. 

Resumindo, para que possa ser exposto em prateleira e vendido em mercados, os produtores orgânicos devem ter uma certificação seja de auditoria, seja de OPAC (participativo). Para vender FLV como orgânicas em feiras, diretamente ao consumidor, a garantia de qualidade é assegurada pelos OCS - Organismos Controle Social. O desconhecimento por parte da população sobre esses sistemas de garantia e certificação limita o consumo.

Outro grande limitante para o consumo de alimentos orgânicos é o seu preço, seguido da percepção de que o seu sortimento ou variedade seria baixo ou insuficiente. 


O preço do alimento orgânico geralmente é mais alto do que o alimento convencional, pois são produtos diferentes. FLVs orgânicas precisam de mais mão de obra na sua produção, além dos custos adicionais com a certificação. Para completar, a oferta de alimentos orgânicos é limitada em comparação com a demanda, e são muitos agricultores produzindo volumes pequenos, sem estruturas intermediárias de concentração da oferta, fatores estes que pressionam o preço. 
No entanto, estudos vêm mostrando que a diferença de preços entre FLVs orgânicas e convencionais depende do canal de distribuição . Em supermercados, o valor de uma cesta de FLV orgânicas pode ser mais que o dobro do valor de uma cesta com os mesmos itens, mas convencionais, também em supermercados. Já quando se compara o valor de uma cesta de FLV orgânicas em feiras agroecológicas com o valor da mesma cesta de convencionais, em supermercados, a diferença é bem menor (aproximadamente 20%). Ou seja, em feiras agroecológicas é possível adquirir FLVs orgânicas a um preço mais próximo do preço das FLVs convencionais de supermercado.

Muitas pessoas têm a percepção de que a variedade de FLVs orgânicas disponível para consumo é baixa. Essa percepção limita a procura e o consumo de orgânicos. Os supermercados visam a regularidade da oferta das hortaliças e frutas mais consumidas - como alface, cenoura, tomate, repolho, pepino, pimentão, batata, laranja, banana, maçã e mamão - mesmo se “fora de época” e a um alto custo ambiental. Já as FLVs orgânicas vêm, normalmente, de culturas adaptadas às condições de solo e clima do local e da estação, respeitando a ecologia das espécies cultivadas. É por isso que nem sempre se encontra a mesma variedade na oferta de FLVs orgânicas quando comparada à das FLVs convencionais. A produção orgânica respeita a sazonalidade, ou seja, a época de plantio e colheita de cada alimento.


Descubra uma feira perto de você https://feirasorganicas.org.br/. Se houver e se for possível pagar um pouquinho a mais, prefira as frutas, verduras e legumes orgânicos com alto valor nutricional, sem resíduos tóxicos e cuja produção é muito mais responsável ambientalmente.

 

***Texto elaborado por Andrei Cechin
Professor do departamento de economia e pesquisador do núcleo de estudos em agroecologia (NEA) da UnB.
Colabora eventualmente com o blog da Seed4Life_Saúde Integrativa 

 

 

Fontes: 

BORGUINI, R.G.; TORRES, Elizabeth Aparecida Ferraz da Silva. Alimentos orgânicos: qualidade nutritiva e segurança do alimento. Segurança alimentar e nutricional, V. 13, nº 2, p.64-75. 2006

ARANTES, Rafael Rioja; RECINE, Elisabetta. Preço de hortaliças orgânicas segundo canal de comercialização. Segurança Alimentar e Nutricional, v. 25, n. 1, p. 13-22, 2018.

INSTITUTO BRASILEIRO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. "Quer pagar quanto?". 2010. Revista do IDEC, Distrito Federal, p. 1, 1 abr. 2010. Disponível em: bit.ly/preçoorganicos. Acesso em: 16 jun. 2021.

MEDATES, Jean Pierre Passos; CECHIN, Andrei; ABREU, Icaro Sousa; MARINHO, Victor; ARAÚJO, Victor. Perspectivas da produção orgânica na ótica do abastecimento alimentar urbano. Em: Cristiane Barreto, Laura Ferreira Darnet, e Armando Fornazier. Nexo Água-Energia-Alimento e a Agroecologia: reflexões, experiências e resultados de pesquisa. Editora Appris, 2022.

RETIÈRE, Morgane; IZIDORO, Raquel. Produtos sem veneno são sempre mais caros? Comparação dos preços de hortaliças produzidas em sistemas convencionais e orgânicos ou em transição em diferentes tipos de canal de comercialização em diversas regiões do Brasil. Piracicaba: Instituto Terra Mater, 2016.

WATANABE, Maria Aico; DE ABREU, Lucimar Santiago; LUIZ, Alfredo José Barreto. The fallacy of organic and conventional fruit and vegetable prices in the metropolitan region of Campinas, São Paulo, Brazil. Journal of Asian Rural Studies, v. 4, n. 1, p. 1-22, 2020.
 

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